A TROVOADA...
Lembro aquela procissão nocturna, em que todas as luzes da povoação foram (em sinal de respeito) apagadas e tudo ficou na penumbra completa; os “marchantes” transportavam nas mãos umas velas horrorosas (que hoje me lembram os rituais do Ku Klux Klan); o único som que se ouvia era a tenebrosa cadencia dos passos sincronizados dos participantes, com o rufar medonho de umas pandeiretas… Chamam a este ritual do terror, “procissão do silêncio”.
Eu era mesmo muito pequenina, mas o pavor foi tal que ainda me recordo de no meio daquele horror ver uma estatua de uma mulher vestida de negro com uma pano branco cheio de manchas vermelhas e olhos vermelhos de sofrimento, e que mais atrás, num caixão de vidro (esquife) vinha um estatua horrível de um homem escanzelado, ferido, cheio de sangue e com uma coroa da espinho na cabeça… Morto… jamais esquecerei aquele horrível quadro… Traumatizante para uma menina tão pequenina como eu era e (pior) EU NÃO ERA A ÚNICA CRIANÇA PRESENTE…
Nesta cena de filme de terror, hoje adulta, pergunto em nome de quê colocam uma criancinha de 4 anos a assistir aquilo, a berrar desalmada de pânico, enquanto todos me mandavam calar e me diziam que era “o Jesus”… ainda me lembro do medo, pavor ,pânico que senti… a minha lembrança mais antiga…
Foi também nessa altura que me lembro da minha primeira trovoada… e lembro-me que o meu pai sempre me ensinou de forma romântica e infantil, para que eu pudesse perceber, como funcionavam as “forças da natureza” mas o meu pai AINDA NÃO ESTAVA LÁ (e por isso, se calhar, me sentia mais apavorada e cheia de medo de tudo, perdida, sozinha) e aquelas horríveis mulheres, fizeram com que eu jamais esqueça aquela trovoada…
Do que lembro é das conterrâneas da terra, algumas ainda vivem (que à falta do que fazer, vão à igreja todos os domingos e só não vão todos os dias porque os senhores priores, felizmente, estão em vias de extinção) quando a trovoada estava poderosamente em cima das nossas cabeças começaram a dizer uma ladainha, uma lengalenga, uma cantilena de contornos mais satânicos que santos a que chamam “Salva Rainha”:
“Santa Bárbara se vestiu e se calçou
Ao caminho se deitou
Jesus Cristo encontrou
Tu Bárbara onde vais,
Eu nem vou nem deixo dir
Só ao céu quero subir,
Para espalhar esta trovoada que no céu anda armada.
Vai Bárbara e espalha por onde não haja nem pão nem vinho nem pintainho a piar
Nem requinhos nem porquinhos a roncar
Nem cordeirinho a berrar,
Onde esteja uma serpente que tenha quarenta filhos
Que não tenha nada para lhe dar se não água de turbal
Que é leite de maldição.
Jesus!!! Jesus!!! Jesus!!!”.
Depois de reler isto que fui “roubar” na Net, ainda fico arrepiada de pensar no coro de mulheres a dizer aquilo e a carpir… uuuuuuuuu…. Que medonho…
Depois o meu pai ensinou-me “que a trovoada era mágica… Era a mãe natureza a ralhar com as pessoas que tinham assustado a Mia” … A partir daí não tive mais medo da trevoada…
Venham todas as trovoadas e tirem-me estas carpideiras da minha lembrança… que não consigo esquecer aquelas vozes tenebrosas e infernais…
Mas o que é a trovoada?
A trovoada vem desde o início dos tempos como algo que representava o inexplicável; Deus, bem, mal… enfim aquilo que não era explicável de outra forma que não cientificamente…
Mas como todos nós sabemos a Grande Mãe é perfeita… quem sabe se a Natureza não desenvolveu a trovoada para “meter na ordem” aqueles que a desrespeitavam?
Um “grito sonoro”, algo entre um rugido e um ronco… algo muito poderoso acompanhado de uma luz tipo “abre olhos” enraivecido… Como um “ralhete”… E ficava tudo “em sentido”, tentando fazer tudo certinho de modo a não “enervar” a grande mãe…
De repente, descobriu-se (que como todas as Grandes Mães), este grito e “abre olhos” não é mais que uma descarga de energia, típica de uma mãe enervada e passámos todos a não ter respeito nenhum pela mãe natureza… passamos a ser filhos com mania que somos espertos e muito mal educados… típicos filhos do Sec.XXI, onde os que os pais dizem não tem qualquer valor…
Mas se a trovoada existe é por algum motivo importante, porque faz falta… alguém sabe para que faz falta a trovoada? Alguém alguma vez pensou que a grande mãe tem coisas muito mais importantes a fazer na terra que se preocupar SÓ com os seres humanos?????
Nós apenas fazemos parte de um ecossistema… porque será que existe um ecossistema??? Para Servir o homem!? HAHAHAHAHAHAHA!!!... Deixem-me rir… podemos destruir o ecossistema, mas seremos destruídos, qual cancro maligno, também porque não somos nem melhores, nem piores, somos IGUAIS a todos os outros seres vivos do planeta …
Bem, mas para que serve a trovoada???
Os divinos sacerdotes da Santa Inquisição (vulgo inquisidores da Santa Fé) diriam que é a ira de Deus… e daí as conterrâneas da “santa terrinha” desataram a carpir mal ouvem o seu primeiro aviso…
Bem, eu cá diria que é a mais natural forma que a natureza encontrou para controlar a densa vegetação queimando-a e desta forma tornar a terra mais fértil… Han??? Onde raio fui buscar estas ideias mirabolantes??? Ora quando é que ocorrem as trovoadas?
No Outono, quando as folhas estão secas e podem facilmente inflamar, mas também quando existe o vento que pode servir para propagar e extinguir e logo de seguida a chuva… assim a cinza fertiliza a terra para novas sementes… por vezes, é necessário fazer uma renovação do terreno… fertilizá-lo renová-lo…
Nos dias de hoje nem se percebe porque existem ondas, ou porque é que a Lua tem diversas fases ou porque existem estações do ano… nos dias de hoje preocupamo-nos é com a politica, o futebol… com o jet-set… enfim, coisas de facto muito importantes…
No entanto a Grande Mãe ainda tem o “poder” (nem que seja momentâneo) de assustar os humanos espertalhões… como? Ora… uma trovoada com o seu gigantesco flash, que por um segundo faz da noite, dia!!! Um espectáculo maravilhoso… mas de seguida vem o RONCO… e quando é daqueles que faz estremecer o chão… hummmm... é de respeito…